Citadinos de Maputo e da Matola, questionados sobre a sua ausência na marcha pela paz em Moçambique, disseram não acreditar no exercício da sua cidadania como forma de fazer os políticos escutarem as suas demandas. “Marchar para quê se ninguém te dá ouvidos” retorquíram.
Numa barraca próxima da praça da independência, na capital moçambicana, o Reporter encontrou nove jovens visivelmente cansados de uma noite de diversão. “Acordamos agora” responderam quando inquiridos se não sabiam da marcha que acabava de terminar a poucos metros do local onde, cerca das 11 horas, já estavam a consumir bebidas alcoólicas.
Já num dos bairros periféricos da Maputo o serralheiro Vasco Paruque, de 33 anos de idade, de forma peremptória afirmou: “os moçambicanos não são unidos, por isso, estamos em conflito entre irmãos. Eu nunca fui a nenhuma marcha ou manifestação porque não creio que isso possa mudar alguma coisa. A solução é a Renamo e o Governo chegarem a um entendimento”.
Na óptica deste munícipe, que não sabe quando nem como a guerra vai cessar para sempre no país, uma manifestação que não mobiliza pelo menos meio milhão de pessoas, dos mais de 25 milhões de moçambicanos, “é sinal claro de que nós mesmos não acreditamos na nossa força de mudar as coisas que nos inquietam. Custo de vida está como todos nós sabemos e a cada dia a piorar. O fim disto tudo está nas mãos de todos os moçambicanos e não só daqueles que organizam marchas e depois são acompanhados por uma centena insignificante de gente”.
“O tempo que eu levaria numa marcha podia fazer alguma coisa para ter dinheiro”
Aida Mavota, de 39 anos de idade, é comerciante de madeira que, segundo contou, traz de Nampula. Ele que desenvolve este negócio desde 2014. Nas suas declarações, a nossa interlocutora deixou transparecer que pouco acredita num fim próximo da crise política, pelo que não participa das manifestações que têm sido convocadas porque “ a mim não interessa falar da paz, toda hora, enquanto doutro lado do mesmo país há irmãos a morrerem por causa de duas pessoas que não se entendem. Hoje, a gente vive mal por causa de duas pessoas ou de dois partidos, que não são nada no meio de milhões de moçambicanos. O mais triste é passarmos fome. Eles que se entendam”.
Olívia Silvino, 65 anos de idade, é desempregada. Ela disse que não soube que havia manifestação marcada para sábado (27) passado, mas mesmo se soubesse não sabe se participaria ou não porque quando amanhece a sua preocupação é procurar alguma coisa para a sua família comer. “Tenho que ajudar o meu marido a colocar comida na mesa e o tempo que eu levaria numa marcha podia fazer alguma coisa para ter dinheiro”.
Segundo esta munícipe, fazer parte de uma caminhada de repúdio contra a guerra, dívidas ocultas, subida do custo de vida e demais problemas que inquietam o povo tem pouco peso, pois “no fim nada muda. Tudo continua a mesma coisa porque o Governo não consegue fazer a Renamo deixar de viver no mato e ter armas. E o Governo parece não estar a conseguir mudar isso”.
Uma jovem estudante de Direito, Cátia Isabel, afirmou que “as pessoas reclamam sempre das mesmas coisas e nada muda. Esta guerra existe há quatro anos e quantos vezes as pessoas saíram à rua para dizer que não queremos guerra? Marchar para quê se ninguém te dá ouvidos? O que é que mudou de lá para cá. Nada. E não acredito que alguma coisa vai mudar, pelo menos por enquanto porque as pessoas que devem garantir a tal paz ou parar com a guerra nem se entendem. Isso tudo mostra que as manifestações não resolvem nada em Moçambique”.
Relativamente ao custo de vida, a nossa entrevistada disse que a situação irá piorar nos próximos tempos, porque para além do próprio conflito militar, “o dólar, que é a principal moeda de transacções comerciais, tende a subir. Eu diria que as pessoas se preparem para o prior porque apesar do discurso de sossego que nos tem sido transmitido, a realidade é outra. Piores dias virão e o aumento diário de preços de produtos é prova disso. Seria bom que o Governo e a Renamo se entendessem para tudo isso acabar”.
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